por Nuno Azinheira/Fotos Orlando Almeida/Global Imagens
(...)
A generalidade dos profissionais da RTP diz que a instrumentalização é um mito.
Mas a minha pergunta é muito concreta: acha que a informação que a RTP faz actualmente é manipulada?
(pausa) Se eu acho? Acho que é, acho que é. Os profissionais da RTP não se podem esquecer de que, ao
trabalharem na RTP,
têm um accionista e que esse accionista é o Estado. Você acha que alguma vez
passariam na RTP
aquelas peças que a Manuela Moura Guedes passava na TVI?
Eram bom jornalismo, aquelas peças?
(pausa) Não, não sei. Mas mesmo que seja uma peça discutível do ponto de
vista jornalístico, pergunto-lhe se acha que elas passariam na RTP? Acha que na RTP poriam em causa daquela maneira o
primeiro-ministro, qualquer que ele fosse? Na TVI a jornalista correu o risco
de as exibir, correu o risco de ser desconsiderada profissionalmente. Acha que
na RTP correriam o risco? Acho que não. E não é
por uma questão jornalística, é porque na RTP o accionista é o Estado.
(...)
Falou de Manuela Moura Guedes e eu faço-lhe de
novo a pergunta: o professor acha que os jornalistas da RTP, ou da RDP ou da Lusa fazem uma
informação, seja nos telejornais, nos noticiários, nas reportagens, nas
notícias, ou nas entrevistas, condicionada pelos governos?
(pausa) Calma, não estou a dizer que os jornalistas das empresas públicas
têm um censor. Mas os jornalistas da RTP sabem para quem estão a trabalhar.
Eles dizem que é para o público.
Estão a trabalhar para o accionista, o Estado. Os jornalistas têm uma
administração, e esta tem uma tutela, que é o Governo. Tal como os jornalistas
da TVI sabem que na sua empresa há limites à sua própria liberdade, quando
tocarem em algum interesse que está ligado àquele grupo de comunicação social.
Mas isso acontece com todos os jornalistas. Eu
trabalho para a Controlinveste, os jornalistas do Público trabalham para o
engenheiro Belmiro, os do Correio da Manhã para o engenheiro Paulo Fernandes,
os do Expresso para o Dr. Balsemão...
Claro, é evidente. Por isso é que lhe digo que temos de perguntar aos
portugueses se estão disponíveis para pagar do seu bolso aquilo que é a
possibilidade de ter uma informação que, estando subordinada à tutela
governamental, pode ser usada para fins políticos.
(...)
"É LEGÍTIMO QUE O GOVERNO CONTROLE O CANAL
INTERNACIONAL"
O grupo de trabalho defende a fusão da RTP Internacional e da RTP África, dando a origem a uma só antena internacional.
Eu ouvi-o dizer que defende que a informação dessa antena internacional pode
estar ao serviço do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que passaria a ser a
tutela desse canal. Explique-me uma coisa: mas isso seria informação ou
propaganda?
(pausa) Chame-lhe o que quiser. Os governos são sufragados e têm
legitimidade para, no meu entendimento, usar o canal internacional para
passarem a imagem de Portugal que eles entendem.
Portanto, passava as praias bonitas, a
gastronomia, os museus e as cidades, mas não passava o desemprego, as greves
gerais, os acidentes, a corrupção. É isso?
(pausa) Se entenderem que isso é importante.
Então quem teriam ao seu serviço? Jornalistas ou
comissários políticos?
(pausa) O contrato que regula a entidade que faz a prestação do serviço e a
entidade que contrata, que seria o Ministério dos Negócios Estrangeiros, tem de
decidir se as pessoas trabalham para ali ou não trabalham para ali. É tão
simples quanto isso.
Mas não seriam jornalistas, seguramente...
Não sei se seriam jornalistas ou produtores de informação, como queira
chamar-lhes. (...)
"O mercado pode auto-regular-se"
Acredita que, na actual conjuntura de um mercado
asfixiado, com a grande competitividade existente, é possível que os agentes do
sector se regulem a si próprios?
Respondo-lhe com uma pergunta: como é que os médicos elegem o seu
bastonário e depois discutem em assembleia os seus estatutos e, depois,
sancionam os médicos?
É um sector diferente.
Claro que é um sector diferente. Só estou a dizer que no caso das
actividades profissionais as pessoas podem auto-regular-se. O problema aqui é a
instrumentalização política e a experiência que temos do passado.
Acha que a ERC é completamente manipulada pelo
poder político?
Completamente manipulada? Nada em Portugal é completamente tudo ou
completamente nada.
Acha que a ERC é manipulada pelo poder político?
A ERC tem uma superstrutura de
nomeação política e essa nomeação pode ser feita pelos seus pares. E qual é o
problema? Todos os mercados permitem auto-regulação. E quando há conflitos
podem ser tratados nos tribunais.
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