Como
jornalista, militante político, entrevistado ou escritor, José Saramago gerou
polémicas e debates.
1975
José Saramago é nomeado director-adjunto do Diário de Notícias, de onde viria a
sair na sequência do 25 de Novembro, decidindo dedicar-se em exclusivo à
escrita. Quando entrou, anunciou aos jornalistas: “Quem não está com a
Revolução, é melhor não estar no Diário de Notícias”. Num tempo de opções
radicalizadas, os editoriais, apesar de não assinados, vinham marcados pelo seu
estilo inconfundível, posto ao serviço da facção gonçalvista do MFA. O
saneamento de três dezenas de jornalistas, na sequência de um documento de
protesto contra a falta de pluralismo do jornal, colou ao seu nome, visto como
o mentor do processo, um rasto de polémica que o acompanhou sempre. Em
declarações sobre o tema ao jornal brasileiro Folha de S. Paulo, Saramago
assumiu a sua responsabilidade na decisão, mas disse que esta não foi apenas
dele, mas de “um corpo coerente de pessoas que fez gorar o golpe preparado no
exterior do jornal.”
1989
O escritor é o primeiro das quatro centenas de
subscritores – entre os quais estavam também Pina Moura, José Luís Judas e
Barros Moura – de um documento, designado Terceira Via, que contestava a
direcção de Álvaro Cunhal e exigia “maior democracia interna” no PCP.
Novembro de 1991
A publicação de Evangelho Segundo Jesus Cristo é
recebida com polémica em Portugal e noutros países, nomeadamente no Brasil, com
a Igreja deste país a criticar o ateísmo do livro e a dizer que se o escritor
fizesse parte da Igreja Católica seria “excomungado”.
Abril de 1992
A polémica em volta de Evangelho Segundo Jesus
Cristo agudiza-se em Portugal, com o sub-secretário de Estado da Cultura,
António Sousa Lara, a excluir o livro da lista de candidatos ao Prémio
Literário Europeu (em que estavam também Pedro Tamen e Fiama Hasse Pais
Brandão, que virão a retirar-se num gesto de solidariedade para com Saramago, e
Agustina Bessa-Luís). “O livro não representa Portugal nem os portugueses”,
justifica o governante. Saramago comenta: “É o regresso da Inquisição”. A
polémica arrasta-se por vários meses e, em 1993, Saramago decide abandonar o
país para fixar residência na ilha de Lanzarote, em Espanha.
Março de 1993
A TVI proíbe a exibição de um anúncio ao livro In
Nomine Dei. Em resposta, o escritor comenta, na sessão de encerramento da Feira
do Livro de Braga: “Deus lhes dê uns bons açoites. (...) A TVI não sabe o que
Deus quer, embora possa saber o que a Igreja quer”.
Janeiro de 1994
Em entrevista à televisão espanhola Antena 3, a
pretexto de Lisboa’94 – Capital Europeia da Cultura, Saramago diz: “Deixem a
cultura em paz”, e contesta o excesso de mediatismo e de artificialidade que
acompanha esse mundo. “Num momento em que a cultura na Europa está moribunda,
entra-se numa operação artificial, com a contribuição dos governos e
autoridades municipais”. “A realidade cultural de Lisboa não é a falsa
realidade de 1994, mas a real de 1992, 1993 ou 1995”, acrescenta.
Janeiro de 1996
José Saramago e José Manuel Mendes subscreveram
uma declaração de apoio à candidatura presidencial de Jorge Sampaio, sem
esperarem pela reunião da Comissão Política do PCP (de que Saramago é membro
desde 1969), que formalizaria a desistência de Jerónimo de Sousa em favor do
ex-presidente da Câmara de Lisboa. É mais um dos inúmeros episódios de
demarcação do escritor relativamente à direcção do PCP. Numa palestra em
Brasília, critica a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), que acusa mesmo
de ser “uma organização criminosa, uma quadrilha que se dedica à extorsão e ao
roubo”. Admite que a IURD “seria legítima” se tivesse “uma nova interpretação
de Deus”. “Mas não. É o engano sistemático, é a exploração da credulidade, da
ingenuidade das pessoas, é a especulação com o sofrimento do povo e sua
desesperança”. O escritor compara os crimes das seitas evangélicas de hoje aos
pecados da Igreja Católica no passado.
12 de Novembro de 1998
A maioria PSD na Assembleia Legislativa da Madeira
rejeita um voto de congratulação e louvor a José Saramago pela atribuição do
Nobel da Literatura. A proposta é votada favoravelmente apenas pelas bancadas
da oposição.
10 de Dezembro de 1998
SIC antecipa no Jornal da Noite o teor do discurso
de José Saramago na cerimónia de atribuição do Nobel, furando o embargo pedido
pelo escritor e motivando a sua fúria. Em reacção à atribuição do prémio, o
jornal oficial do Vaticano, L’Osservatore Romano, diz que a distinção tinha
sido “ideologicamente orientada”.
27 de Fevereiro de 1999
Num colóquio em Lisboa sobre os 25 anos do 25 de
Abril, Saramago diz acreditar que se a Revolução dos Cravos não tivesse sido
feita, Portugal estaria igual ao que é hoje. “O 25 de Abril acabou. É história.
É uma promessa que não se realizou”. E acrescenta: “Não quer dizer que não o
devêssemos ter feito. Apenas que não soubemos, não pudemos ou não nos deixaram
mantê-lo”.
Agosto de 1999
Recusa ser doutorado “honoris causa” pela
Universidade de Belém do Pará, em sinal de protesto contra o modo como decorre
o julgamento do massacre ocorrido na povoação de Eldorado dos Carajás, a 17 de
Abril de 1996, em que 155 soldados da polícia militarizada abriram fogo contra
uma manifestação de camponeses tendo provocado 19 mortos e um número
indeterminado de feridos. “Já não imaginava que em pleno século da chamada
democracia global pudessem acontecer coisas assim”, justifica Saramago.
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