Costuma dizer-se que, em política, é
mais importante parecer sério do que ser sério. Passos Coelho sempre o pareceu.
Aliás, fez mais do que isso. O primeiro-ministro é o homem que vive em
Massamá. Aquele que passa férias numa casa alugada num local simbolicamente
chamado Manta Rota. O asceta que tem uma vida remediada. O político que prefere
ler os discursos do papel em vez de usar o teleponto. O objectivo é claro:
contrastar com o antecessor na liderança do país. Passos Coelho parecia ser
sério. E tem usado essa áurea de seriedade para impor sacrifícios ao país. Nada
indicava que não o era.
O problema é que a realidade tem o
hábito de vir ao de cima. E os episódios sucederam-se. Primeiro foi o eventual favorecimento da Tecnoforma, empresa
da qual era consultor, quando Miguel Relvas era secretário de Estado, entre
2002 e 2004. Depois foi a revelação de que, além de consultor, afinal Passos foi também administrador da mesma
empresa. Seguiu-se a notícia de que, afinal, Passos Coelho, ainda deputado do
PSD, foi o impulsionador de uma ONG ligada à Tecnoforma cujo
objectivo era obter financiamentos destinados a projectos de cooperação.
Problema: na época, Passos Coelho era deputado em regime de exclusividade. E
isso levantou a questão: foi ou não pago pelo trabalho à frente do Centro
Português para a Cooperação? Ele não negou ter recebido dinheiro. Houve ainda outro detalhe:
ele disse que tinha exercido o mandato de deputado em exclusividade; o Parlamento desmentiu-o. Mas, em
1999, recebeu um subsídio de reintegração por ter exercido funções em regime
de exclusividade – que ele próprio declarou.
Mais tarde revelou que recebeu do CPPC apenas “despesas de representação” para
pagar almoços e deslocações e divulgou um despacho de arquivamento de uma investigação
do Ministério Público ao caso. No fim-de-semana surgiram notícias de que não
pagou as contribuições obrigatórias para a segurança social entre 1999 e 2004.
Agora que teve vários processos de execução fiscal.
Às dúvidas recentes, Passos Coelho
respondeu da mesma forma que já tinha feito no passado. Com um não me lembro.
Como se os anos entre 1999 e 2007 fossem um buraco negro na sua vida. Anos
apagados da memória. Ele até pode tentar manter a aparência de seriedade.
O problema – que não é pessoal, é político – é que a convicção de que,
pelo menos nesses anos misteriosos, não foi sério é cada vez maior. Ou
seja inverteu o paradigma: para ele, neste momento, era mais importante ter
sido sério do que parecê-lo.
Blogue do autor: O Informador – N.T.Pinto
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