Drones de combate a
incêndios. Força Aérea debaixo de fogo do governo
O Estado pagou 4,5 milhões de euros por 12 drones de vigilância. O
concurso foi urgente para tudo estar operacional em 1 de julho, início da fase
crítica de fogos, mas nenhum voo foi cumprido até agora pela Força Aérea.
Quando se gastam, em concurso urgente, 4,5 milhões de euros em dinheiros
públicos para instalar um sistema de drones ultramodernos, se promete a voar
logo no início da época crítica de fogos e se falha o objetivo, de quem é a responsabilidade
?
O governo, que teve dois ministros (Ambiente e Defesa) a anunciar prazos
que não foram cumpridos, atira para a Força Aérea as explicações. Esta,
por sua vez, ignora as datas de documentos oficiais e refaz os planos à sua
medida com dois meses de atraso em relação ao definido na Resolução de Conselho
de Ministros (RCM) que determinou a aquisição das aeronaves.
Resposta à pergunta: não há. Resultado: apesar da
volumosa despesa (que até se podia justificar, tendo em conta como os recursos
destes drones) e de um contestado ajuste direto, a vigilância da floresta não
vai contar com estas aeronaves antes do final do mês, já passados dois terços
da fase mais crítica dos incêndios (fase IV - de 1 de julho a 30 de setembro) -
e isto se a Força Aérea cumprir a sua própria agenda.
A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil
(ANEPC), que coordena as operações de combate a incêndios, e a sua tutela, o
Ministério da Administração Interna, não comentam e reencaminham também para os
militares.
Quem não deixou passar como incongruências do processo
foi o PSD que pediu uma audição com urgência ao ministro da Defesa
Quem não deixou passar como incongruências do processo
foi o PSD que pediu uma audição com urgência ao ministro da Defesa para, entre
outros temas (como o da derrapagem na despesa das obras
do antigo Hospital Militar de Belém , noticiada pelo DN), o questionar
sobre esta matéria.
"O governo já apresentou mais vezes estes drones
do que os utilizou. Nenhum dado do que anunciou bateu certo com o que está a
funcionar" , assinala o deputado Duarte Marques, membro da
1º comissão parlamentar (Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias) , responsável pela área de Proteção Civil e incêndios.
"É mais uma manobra de propaganda e de má gestão de dinheiros
públicos. Transparência a menos e propaganda a mais"
"É mais uma manobra de propaganda e de má gestão de dinheiros públicos. Transparência a menos e propaganda a mais", critica. "Se o dinheiro investido formal drones tivesse sido utilizado para reequipar os bombeiros, teria sido mais útil", completa.
João Gomes Cravinho tem a tutela da Força Aérea e já
anunciou datas para o início das operações que depois não se verificaram ( ver cronologia em baixo ). Questionado
pelo DN sobre os vários incumprimentos, este remeteu explicações para a Força
Aérea.
Duarte Marques, responsável pela proteção
civil e incêndios do grupo parlamentar do PSD © Pedro Rocha / Global
Imagens
O PSD não concorda com esta opção
estratégica. "Há um deslumbramento com os drones, como se resolvido o
problema dos fogos, quando o principal problema é o combate. Enquanto se
compram drones com tecnologia de ponta, a dos bombeiros é do século passado ",
assevera.
A 11 de maio passado foi o ministro do Ambiente a dar o tiro de partida deste
processo e o cometer o primeiro deslize ( ver cronologia em baixo ). João
Matos Fernandes anunciou a aquisição, com financiamento do Fundo Ambiental, e
afirmou que estariam a funcionar a 1 de julho.
PREVENÇÃOIncêndios. Drones feitos em Portugal nascem um
contrarrelulador
Esse objetivo foi de novo reforçado na RCM , sete dias depois. "Assegurar
a disponibilidade da utilização dos UAS classe 1 em momento anterior ao nível
de maior empenhamento reforçado, nível IV, do DECIR 2010", está
escrito. Este "nível IV" começa a 1 de julho e termina a 30 de
setembro, de acordo com a tabela da ANEPC relativa aos "níveis de
empenhamento operacional".
Ministro do Ambiente, João Matos Fernandes
financiou o novo sistema de drones através do Fundo do Ambiente © MIGUEL
A.LOPES / LUSA
Questionado sobre o incumprimento destes
dados e como avaliação a gestão destes fundos do Ambiente, fonte oficial do
gabinete de Matos Fernandes remeteu para o Ministério da Defesa e para a Força
Aérea.
O concurso lançado e o seu desfecho também
levantaram muitas dúvidas: só uma das empresas, uma UAVision que já trabalhado
com a Força Aérea noutros projetos com drones iguais, corrigir cumprir todos os
requisitos.
Numa reportagem que o DN fez na sua fábrica , a 19 de
julho último, o diretor Nuno Simões assumindo que podia haver
atrasos. Contactado agora para dizer se uma derrapagem das datas para os
drones começarem a operar eram da responsabilidade da sua empresa, recusou
fazer comentários.
A Força Aérea não respondeu a nenhuma das
perguntas colocadas pelo DN sobre incumprimentos de prazos. Nem a problemas
sobre porque comprou 12 drones, quando só podem operar três em simultâneo (só
há três bases), nem porque não foram aproveitados pelos pilotos da Marinha e do
Exército, o que permitiria ter estes recursos disponíveis mais cedo.
Na sua resposta, não assume nenhum atraso e
apresenta o seu road map , que indica o final deste mês como prazo
para os 12 drones estarem a operar, ignorando assim os datas da RCM, do
contrato e as prometidas pelos ministros.
Chefe de Estado-Maior da Força Aérea, Joaquim Borrego
Na informação distribuída à imprensa no dia 4 de
agosto, a Força Aérea afiançava que, nessa data, prosseguiam "como
atividades planeadas de formação e entrega dos equipamentos", elaborando
que "durante esta fase, desenrola-se o processo de aceitação, certificação
e testes efectuados para iniciar a implementação operacional nas três bases de
operação: Lousã, Macedo de Cavaleiros e Foia "- isto mais de um mês depois
do prazo estipulado para o estar operacional e no dia limite para a entrega de
todos os equipamentos por parte da empresa.
A Força Aérea, comandada pelo atualmente geral Joaquim
Borrego , garante que, "de forma célere e cumulativa, adaptou-se
e está a edificar uma nova capacidade, identificou requisitos, definiu
processos complexos, concretizou um procedimento pré-contratual, disponibilizou
recursos humanos, efetuou cursos de formação de operadores e vem acompanhando a
execução do contrato pelo adjudicatário, em especial quanto à qualificação,
certificação e aceitação das aeronaves, não abdicando de critérios de segurança
de voo rigorosos, tudo isto num período de tempo reduzido reduzido ".
"Nos casos em que o cocontratante não cumprir as obrigações
contratuais, por factos que sejam imputáveis, serão aplicadas como penalidades
previstas"
Promete que "nos casos em que o cocontratante não
cumpre as obrigações contratuais, por factos que sejam imputáveis, serão
aplicadas como penalidades previstas".
Entretanto, a GNR, entidade que tem a competência,
desde 2016, para "a coordenação das ações de prevenção relativa à vertente
da vigilância, da deteção e fiscalização", sublinhou ao DN que "como
70 ações de vigilância com recurso aos drones da GNR resultaram três alertas
relativos a ignições, que não apimentados sido detetadas por outros meios
".
"As 70 ações de vigilância com recurso aos drones da GNR resultaram
três alertas alertas a ignições, que não anteriores sido detetadas por outros meios".
A GNR, atualmente comandada pelo tenente-geral Rui
Clero , está atualmente de 14 drones e desde 2015, quando iniciou o
"Sistema de Vigilância do Ambiente e da Natureza no Alto Minho" (Projeto
VIANA), no âmbito de um protocolo de cooperação assinado entre a GNR e um grupo
tecnológico português, que vem a aperfeiçoar este sistema de vigilância.
Na RCM que determinou a aquisição dos 12 novos drones, um GNR é fornecido como "coordenadora" da operação das aeronaves, em conjunto com a Força Aérea. A sua intervenção, no entanto, ainda não passou da fase dos preparativos.
O tenente-geral Rui Clero é o comandante-geral da GNR © Paulo Jorge
Magalhães / Global Imagens
"Após diversas reuniões de coordenação com a
Força Aérea Portuguesa (FAP), foram identificados como entidades que
monitorizarem as imagens captadas pelos UAS da FAP, prevendo-se a realização de
monitoramento de vigilância e deteção a partir de três bases (Macedo de
Cavaleiros , Lousã e Fóia) ", rápida o porta-voz oficial desta força de
segurança.
Quando as aeronaves da Força Aérea Levada operacional,
será a GNR a fazer a "coordenação dos dias / horas e locais / áreas a
visionar".
Acrescenta que "foram já elevados duas equipas:
uma apoiada pela Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) e
Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), para garantir esse
mesmo objetivo de regulamentação nacional, pronta a realizar as análises
estratégicas , por forma a que o empenhamento destes meios UAS pode ser mais
eficiente; e uma segunda equipa para visionamento e análise das imagens de
transmissão e transmissão das ocorrências detetadas ".
Cronologia
MAIO
11
Governo promete reforço da vigilância e aposta em drones com maior raio de
ação. O ministro do Ambiente faz o anúncio de aquisição de 12 drones por 4,5 milhões,
detalhando algumas características muito específicas no mercado. Afirma
que estará a funcionar a 1 de julho. Estas declarações foram públicas e
estão registradas pela comunicação social.
18
Resolução do Conselho de Ministros n.º 38-A / 2020,
que autoriza a Força Aérea a realizar despesa com a aquisição de sistemas
aéreos não tripulados para vigilância aérea no contexto do dispositivo Especial
de Combate a Incêndios Rurais:
1. Determina a aquisição imediata de 12 sistemas de aeronaves não
tripuladas (UAS) Classe 1.
2. Definir dia 1 de julho como o início das operações.
3. Autoriza a Força Aérea a realizar em 2020 a despesa até ao
montante de 4 545 000,00 euros.
4Considera urgentes e de interesse público os procedimentos de
contratação pública, de maneira a assegurar a disponibilidade de utilização dos
UAS "em momento anterior ao nível de maior empenhamento operacional
reforçado, nível IV, do DECIR 2020" - seja ou, 1 de julho.
5. Determinar que uma operação dos UAS é coordenada entre a Força
Aérea e a GNR, para operação de vigilância, e com a Autoridade Nacional de
Emergência e Proteção Civil (ANEPC), no quadro de combate a incêndios rurais,
incluindo as operações de rescaldo e de vigilância ativa pós-rescaldo.
JUNHO
9
Abertura do concurso por convite limitado a três empresas com envio do caderno
de encargos a UAVision, Tekever e Ceiia. A data para entrega e discussão
de propostas foi de apenas sete dias e coincidiu com a semana dos feriados de
10 e 13.
12
As empresas convidadas fazem perguntas sobre os requisitos.
15
Força Aérea envia esclarecimentos.
16
Apenas uma empresa, um UAVision, apresenta uma proposta, enquanto as outras
duas empresas apresentam uma declaração de protocolo sobre o caderno de
encargos que, no seu sentido, apontava para uma "solução única", da
UAVision. "Considere não estarem reunidas as condições (desde logo de
sã, aberta e competitiva) para a apresentação de uma proposta, optando assim
por não o fazer."
JULHO
3
Força Aérea assina contrato com a UAVision. De acordo com o documento,
apenas disponibilizado no portal base.gov a 1 de agosto (e incompleto), todos os
12 drones, juntamente com um conjunto de viaturas adaptadas ao seu transporte,
até 2 de agosto. Nesta data, ao contrário do que definia a RCM e o
ministro do Ambiente, nenhum dos drones estava a operar.
17
O ministro da Defesa Nacional anuncia dois drones a voar a 21 de julho a partir da
Lousã. E em dez dias, dois a partir de Monchique e dois a partir de Macedo
de Cavaleiros. Nada foi cumprido.
19
Numa reportagem do DN , o diretor da UAVision assume
que pode haver atrasos na entrega dos drones e do equipamento restante.
AGOSTO
4
Na data em que todos os drones, segundo o contrato, deve entregar, os ministros
do Ambiente e da Defesa protagonizam uma ação de promoção do novo sistema de vigilância florestal ,
com ampla difusão na comunicação social.
Foi apenas indic um dos drones em voo de teste no
aeródromo da Lousã. Cravinho adiantou que o sistema começou a funcionar em finais
de julho , com algum atraso relativamente ao previsto, o que se deveu
à "necessidade de aperfeiçoar as máquinas".
Nesta altura, porém, o sistema não estava a
funcionar. Apenas havia um drone de teste.
Por seu lado, o ministro do Ambiente afirmou que o
sistema seria "constituído por dez aeronaves em funcionamento, como duas
de reserva".
Esta informação não está rigorosa. Segundo a própria
Força Aérea, vai estar a operar em vigilância de vigilância sete aeronaves,
distribuídas pelas três bases (embora só funcione uma de cada vez). Outras
três são para formação e, sim, duas para reserva.
Neste dia, a Força Aérea distribui o seu elemento ("mapa
rodoviário"), indicando que as 12 aeronaves só estão operadas a 31 de
agosto.
10
Este era o dia apontado pela Força Aérea para a instalação da base da
Foia. Não há notícia de ter sido cumprido.
Desde 4 de agosto, o dia da ação do governo em que foi
feito um voo de teste, que não se registrou nos sistemas de controle aéreo
quaisquer voos operacionais com estes drones.
Apenas foi registado um voo na Ota com um destes
aparelhos, de formação ou validação, que pode ter sido com uma das aeronaves
"Ogassa" que levanta e aterra verticalmente (uma das funcionalidades
que distinguem estes drones da concorrência).
Atualizado às 10h20: Corrigida a função de Duarte Marques. O deputado pertence à 1ª comissão parlamentar (Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias) e não à Defesa como, por lapso, estava escrito
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