Para que servem as primeiras páginas dos jornais e os grandes casos
dos noticiários das TV?
Se pensarmos no que as primeiras páginas e as aberturas dos telejornais
nos disseram enquanto decorriam as traficâncias que iriam dar origem aos
casos do BPN, do BPP, dos submarinos, das PPP, dos SWAPS, da dívida, e
agora do Espírito Santo, é fácil concluir que servem para nos tourear.
Desde 2008 que as primeiras páginas dos Correios das Manhas, os telejornais
das Moura Guedes, os comentários dos Medinas Carreiras, dos Gomes
Ferreiras, dos Camilos Lourenços, dos assessores do Presidente da
República, dos assessores e boys dos gabinetes dos ministros, dos
jornalistas de investigação nos andam a falar de tudo e mais alguma
coisa, excepto das grandes vigarices, aquelas que, de facto, colocam em
causa o governo das nossas vidas, da nossa sociedade, os nossos
empregos, os nossos salários, as nossas pensões, o futuro dos nossos
filhos, dos nossos netos. Que me lembre falaram do caso Freeport, do
caso do exame de inglês de Sócrates, da casa da mãe do Sócrates, do tio
do Sócrates, do primo do Sócrates que foi treinar artes marciais para a
China, enfim que o Sócrates se estava a abotoar com umas massas que
davam para passar um ano em Paris, mas nem uma página sobre os Espirito
Santo! É claro que é importante saber se um primeiro-ministro é
merecedor de confiança, mas também é, julgo, importante saber se os
Donos Disto Tudo o são. E, quanto a estes, nem uma palavra. O máximo que
sei é que alguns passam férias na Comporta a brincar aos pobrezinhos.
Eu, que sei tudo do Freeport, não sei nada da Rioforte! E esta minha
informação, num caso, e falta dela, noutro, não pode ser fruto do acaso.
Os diretores de informação são responsáveis pela decisão de saber
uma e desconhecer outra.
Os jornais, os jornalistas, andaram a tourear o público que compra
jornais e que vê telejornais.
Em vez de diretores de informação e jornalistas, temos novilheiros,
bandarilheiros, apoderados, moços de estoques, em vez de notícias temos
chicuelinas.
Não tenho nenhuma confiança no espírito de autocrítica dos jornalistas
que dirigem e condicionam o meu acesso à informação: todos eles aparecerão
com uma cara à José Alberto de Carvalho, à Rodrigues dos Santos, à
Guedes de Carvalho, à Judite de Sousa (entre tantos outros) a dar as
mesmas notícias sobre os gravíssimos casos da sucata, dos apelos ao consenso
do venerando chefe de Estado, do desempenho das exportações, dos engarrafamentos
do IC 19, das notas a matemática, do roubo das máquinas multibanco, da vinda
de um rebenta canelas uzbeque para o ataque do Paiolense de Cima, dos enjoos de
uma apresentadora de TV, das tiradas filosóficas da Teresa Guilherme. Todos
continuarão a acenar-me com um pano diante dos olhos para eu não ver o
que se passa onde se decide tudo o que me diz respeito.
Tenho a máxima confiança no profissionalismo dos diretores de informação,
que eles continuarão a fazer o que melhor sabem: tourear-nos. Abanar-nos
diante dos olhos uma falsa ameaça para nos fazerem investir contra ela
enquanto alguém nos espeta umas farpas no cachaço e os empresários
arrecadam o dinheiro do respeitável público.
Não temos comunicação social: temos quadrilhas de toureiros, uns a pé,
outros a cavalo.
Uma primeira página de um jornal é, hoje em dia e após o silêncio
sobre os Espírito Santo, um passe de peito. Uma segunda página será uma
sorte de bandarilhas.
Um editor é um embalador, um tipo que enfia umas peúgas de couro nos
cornos do touro para a marrada não doer.
Um diretor de informação é um “inteligente” que dirige uma corrida.
Quando uma estação de televisão convida um Camilo Lourenço, um Proença
de Carvalho, um Gomes Ferreira, um João Duque, um Gomes Ferreira, um Júdice,
um Marcelo, um Miguel Sousa Tavares, um Ângelo Correia, devia anunciá-los
como um grupo de forcados: Os Amadores do Espírito Santo, por exemplo.
Eles pegam-nos sempre e imobilizam-nos. Caem-nos literalmente em cima.
As primeiras páginas do Correio da Manhã podiam começar por uma introdução
diária: Para não falarmos de toiros mansos, os nossos queridos
espectadores, nem de toureios manhosos, os nossos queridos comentadores,
temos as habituais notícias de José Sócrates, do memorando da troika, da
imperiosa necessidade de pagar as nossas dividas.
Todos os programas de comentário político nas TV deviam começar com a
música de um passo doble. Ou com a premonitória “Tourada” do Ary dos Santos,
cantada pelo Fernando Tordo.
O silêncio que os “negócios “ da família dona disto tudo mereceu da
comunicação social, tão exigente noutros casos, é um atestado de cumplicidade:
uns os jornalistas venderam-se, outros queriam ser como os Espírito
Santo. Em qualquer caso, as redações dos jornais e das TV estão cheias
de Espíritos Santos. Em termos tauromáquicos, na melhor das hipóteses
não temos jornalistas, mas moços de estoques. Na pior, temos as redações
cheias de vacas a que se chamam na gíria as “chocas”.
O que o silêncio cúmplice, deliberadamente cúmplice, feito sobre o
caso Espirito Santo, o que a técnica do desvio de atenções, já usada por
Goebels, o ministro da propaganda de Hitler, revelam é que temos uma
comunicação social avacalhada, que não merece nenhuma confiança.
Quando um jornal, uma TV deu uma notícia na primeira página sobre
Sócrates (e falo dele porque a comunicação social montou sobre ele um operação
de barragem pelo fogo, que na altura justificou com o direito a sabermos
o que se passava com quem nos governava e se esqueceu de nos informar
sobre quem se governava) ficamos agora a saber que esteve a fazer como o
toureiro, a abanar-nos um trapo diante dos olhos para nos enganar com
ele e a esconder as suas verdadeiras intenções: dar-nos uma estocada
fatal!
Porque será que comentadores e seus patrões, tão lestos a opinar sobre
pensões de reforma, TSU, competitividade, despedimentos, aumentos de impostos,
gente tão distinta como Miguel Júdice, Proença de Carvalho, Ângelo
Correia, Soares dos Santos, Ulrich, Maria João Avilez e esposo Vanzeller,
não aparecem agora a dar a cara pelos amigos Espírito Santo?
Porque será que os jornais e as televisões não os chamam, agora que
acabou o campeonato da bola?
Um grande Olé aos que estão agachados nas trincheiras, atrás dos
burladeros!
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