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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Prémio salarial na função pública - mais baixo do que se pensava?

O Banco de Portugal revisitou o polémico tema do diferencial de salários entre 
sector público e sector privado. Apesar de o assunto ter passado mais ou menos 
despercebido aos radares da comunicação social, é interessante analisar com 
atenção o estudo publicado no Boletim Económico de Inverno. As conclusões 
diferem substancialmente das que foram avançadas num estudo semelhante, de 2009 
- o artigo em que o Governo se baseou para defender o corte de subsídios de Férias 
e de Natal na Função Pública.
Comecemos pelas conclusões do primeiro estudo - Wages and Incentives 
in the Public Sector. Neste artigo, os economistas do BdP compararam salários 
do sector privado com salários do sector público, mantendo constantes factores 
como o grau de escolaridade e os anos de experiência profissional. Os dados 
foram retirados dos "Quadros de Pessoal", da Segurança Social, e do 
"Recensamento Geral da Administração Pública". Os resultados aparecem 
sumarizados no quadro de baixo. Por questões de espaço e conveniência, 
omitimos os números para 1996.

O estudo confirma que há uma grande diferença ("Raw gap") entre salários do sector 
público e do sector privado. Mas mostra também que uma larga fatia deste diferencial 
pode ser explicado por variáveis como a experiência e a formação ("Differential 
in characteristics"). Quando se mantém estas características constantes, chega-se 
a um "prémio puro" ("wage premium") de 14,5% em 1999 e de 16,9% em 2005. 
Os prémios tornam-se ainda maiores quando é calculado em função do tempo 
de trabalho (penúltima coluna - "overall - hourly wage"). 
O novo estudo - Diferenças salariais entre os setores público e privado no 
período que antecedeu a adoção do euro - introduz duas alterações em relação 
ao primeiro artigo. A primeira é a base de dados da qual são extraídos os salários 
e características da população em análise, que passa a ser o PAFCE, um inquérito 
da responsabilidade do Eurostat. Isto permite uma comparação transversal a vários países. 

Apesar de a fonte de dados ser diferente, as conclusões, para Portugal, 
são semelhantes às do anterior estudo, com um prémio salarial significativo 
no sector público. Note-se que estes prémios são relativos ao salário/hora, 
pelo que devem ser comparados com a penúltima linha do quadro anterior. 
Note-se também que só há um período - 1999 - para o qual os dois estudos 
apresentam dados. E, aqui, ambos os estudos chegam a um prémio relativamente 
alto - 17,8 e 22,4%. Curiosamente, Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha são
os países em que há um diferencial maior. 
Uma das críticas habituais a este tipo de estudos é que não levam em conta uma 
possível indogeneidade na escolha do sector. Ou seja, assumem que as características
que são levadas em conta na regressão - nível de educação, anos de experiência, etc. 
- são as únicas que afectam a produtividade, pelo que quaisquer diferenças salariais 
entre pessoas com as mesmas características poderão ser "lidas" como 
"prémios puros". Ora, se a "selecção" do sector de trabalho (público vs. privado) 
não for independente da produtividade relativa de cada trabalhador, estes resultados 
podem ser enviesados. Por isso, os economistas do Banco de Portugal introduziram
uma segunda nuance: um controlo para este tipo de efeitos "não observáveis". 
Os resultados, sumarizados na tabela de baixo, são significativamente 
diferentes dos que foram apresentados na análise anterior.
Conclusões: em 1999, o diferencial era de 4,4%, e não de 22,4% - uma diferença 
significativa, mesmo tendo em conta as deficiência implícitas em qualquer
método que estime "características não observadas". O próprio estudo reconhece
que "A diferença entre as estimativas obtidas usando o método de efeitos
fixos [controlo da endogeneidade] e os mínimos quadrados sugere que os últimos
podem sofrer de um enviesamento resultante da omissão de fatores relevantes
que contribuam para a determinação dos salários observados". E esta, hein?

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