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quarta-feira, 26 de abril de 2023

OS MORTOS PELA PIDE EM 25 DE ABRIL

 No final do dia 25 de Abril de 1974, a PIDE/DGS cometeu os últimos assassinados da sua longa história, matando quatro manifestantes na Rua António Maria Cardoso.

Por Álvaro Arranja.

Diário Popular de 26 de Abril de 1974. Fuzileiros prendem agentes da PIDE.

Alfredo Dinis (Alex), Humberto Delgado, Dias Coelho, Ribeiro dos Santos…muitos foram os assassinados pela PIDE/DGS, nos longos anos de existência da polícia política, principal instrumento de repressão da ditadura. No último dia da sua ação, a PIDE atuou em coerência com a sua história.

No dia 25 de Abril, quando as tropas de Salgueiro Maia abandonam o Terreiro do Paço e se dirigem para o Carmo, a população tem a noção de que a ditadura está a caminho da derrota e manifesta o seu apoio aos militares do MFA, com uma enorme multidão nas ruas.

A PIDE/DGS, como principal organização repressiva do regime, concentra o ódio popular.

A Revolução de Abril na imprensa italiana

De manhã, por iniciativa do então Capitão-Tenente Almada Contreiras, já uma força de fuzileiros tinha tentado ocupar a sede da PIDE/DGS, mas tinha retirado quando constatou não ter armamento suficiente para conduzir a operação com eficácia.

Uma primeira manifestação tinha avançado pela rua António Maria Cardoso, provocando os primeiros disparos e os primeiros feridos, por volta das 13h30.

Mas será só depois de terminada a ação das forças de Salgueiro Maia, com a rendição de Marcelo Caetano, que a sede da PIDE/DGS se tornará o centro dos acontecimentos, com os manifestantes a concentrarem ali as suas atenções.

Segundo o Diário de Notícias, “após a partida do Chaimite conduzindo o Prof. Marcelo Caetano e restantes individualidades do Governo deposto, algumas centenas de pessoas juntaram-se no Terreiro do Paço, percorrendo em seguida as ruas da Baixa. A passagem pela Rua António Maria Cardoso ficaria tristemente assinalada. Funcionários da Direção Geral de Segurança dispararam rajadas de metralhadora contra os manifestantes. Eram vinte horas e dez minutos.”i.


Diário de Notícias de 26 de Abril de 1974

O jornal República refere que, apesar de a revolução não ter sido violenta, “elementos da PIDE/DGS, último reduto de resistência às tropas do movimento, dispararam rajadas de metralhadora sobre um numeroso grupo de populares que desfilou junto à sede daquela corporação, na Rua António Maria Cardoso, quando percorria, ao princípio da noite de ontem, toda a Baixa da cidade, manifestando o seu apoio às forças triunfantes”ii.

Tal como o Diário de Notícias, o República publica a foto de um ferido pela PIDE, José Morgado Rodrigues, escriturário, atingido na primeira manifestação, pelas 13h30.

República de 26 de Abril de 1974

A Capital dá a notícia correta do número de mortos junto à sede da PIDE/DGS. Segundo o jornal, “dezenas de feridos, alguns ainda por identificar, e quatro mortos, dois deles já identificados, recolheram, entre ontem à noite e esta madrugada, respetivamente ao Hospital S. José e ao Instituto de Medicina Legal”iii.


A Capital de 26 de Abril de 1974

A identificação de três dos mortos é revelada, no dia 28, pelo jornal O Século. São eles: “José James Harteley Barneto, escriturário, de 37 anos, casado, natural de Vendas Novas; Fernando Luís Barreiros dos Reis, de 24, natural de Lisboa, soldado da 1ª Companhia Disciplinar, em Penamacor; João Guilherme Rego Arruda, de 20 anos, estudante de Filosofia, natural de S. Miguel, Açores”iv.

Faltava identificar a mais jovem das vítimas, Fernando Carvalho Gesteira, de 17 anos, empregado do comércio, natural de Vila Pouca de Aguiar.

A estes se juntaram 45 feridos, transformando a Rua António Maria Cardoso num cenário de guerra urbana que tinha sido evitada nos outros palcos da revolução.

Após o fim do tiroteio, a reação de muitos populares foi correr ao Largo do Carmo, para pedir auxílio às tropas do MFA que ali se encontravam. Eram forças do Regimento de Cavalaria 3, de Estremoz.

A descrição completa do que aconteceu após o tiroteio, podemos encontrá-la no relatório da operação “25 Abril 74”, assinado pelo Capitão Andrade Moura:

A libertação dos presos políticos na revolução de Abril

“Cerca das 20h30, fui alertado pela população de que elementos da DGS tinham aberto fogo de que resultou a morte de, pelo menos, um civil e vários feridos. Em face desta informação, dirigi-me para a rua António Maria Cardoso e fim de evitar mais derramamento de sangue.

Foram enormes as dificuldades para que uma EBR e dois jeeps atingissem o local pois a população com o seu desejo de vingança e completamente fora de si impedia qualquer manobra. Atingida a rua acima mencionada, estacionou a EBR junto ao Teatro S. Luís. A população pedia vingança e que se atacasse o edifício, em cujas janelas se viam alguns elementos da corporação.

Verificando que a força era pequena para iniciar o cerco, ordenei a comparência de reforços que estavam junto ao Quartel do Carmo. Vindo estes mantive a EBR junto ao S. Luís e coloquei vários atiradores nessa rua enquanto outra EBR e atiradores tomaram posição na rua Duques de Bragança e, mais tarde na rua Vítor Cordon. Após este dispositivo montado e verificando que as forças eram insuficientes, solicitei ao comando do Movimento instruções e reforços para fechar completamente o cerco. Como não foram recebidas ordens para um ataque que continuava a ser exigido pela população, este não foi realizado. Tentei explicar à população a nossa atitude. Após bastantes esforços, fui compreendido e, apesar de não arredarem pé, não interferiram, pedindo unicamente para não os deixarmos fugir”v.


Diário Popular de 26 de Abril de 1974. Fuzileiros prendem agentes da PIDE.

A informação dos acontecimentos da Baixa chega ao Posto de Comando do MFA, na Pontinha. Otelo diz a Spínola para ordenar ao ex-Ministro do Interior, Moreira Batista que “entre em ligação com a sede da PIDE/DGS e exorte o Major Silva Pais a promover a rendição (…) isto para evitar que o edifício tenha de ser bombardeado a curta distância. César Moreira Batista obedece”vi.


Diário Popular 26.04.2023

Mas é só no dia seguinte que termina este momento de tensão. Dá-se a rendição da PIDE/DGS. Segundo o Diário Popularvii, “eram 9 e 30 quando o Tenente Melo Saigão, dos Fuzileiros Navais, se aproximou dos jornalistas e anunciou:

- Pronto, renderam-se.”

O Programa do MFA que previa expressamente a “extinção imediata da DGS”, depois dos mortos do dia 25 tinha de ser rapidamente executado, ignorando as reticencias levantadas por Spínola.

Essa era a exigência popular, proclamada a mil vozes nas ruas onde se vive a festa da liberdade.


i Diário de Notícias, 26.04.1974

ii República, 26.04.1974

iii A Capital, 26.04.1974

iv O Século, 28.04.1974

v Relatório publicado em Almeida, Diniz de, Origem e Evolução do Movimento dos Capitães, Lisboa, Edições Sociais,1977, pág.383

vi Saraiva de Carvalho, Otelo, Alvorada em Abril, Lisboa, Ulmeiro, 1984, pág. 473

vii Diário Popular, 26.04.1974

FONTE

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