O pós-polvo
20/2/2017,
Todos os dias vemos crescer, qual polvo, dentro do Estado, os tentáculos da ideologia. Na Educação, na Saúde, no Trabalho. Quando a geringonça se desfizer o polvo lá ficará trabalhando para ela.
Menos Matemática e menos Português. Mais ideologia e muita conversa da
treta ou seja o regresso da Cidadania e Área de Projecto. À primeira vista é o
que se oferece dizer sobre as mudanças curriculares agora anunciadas. Claro que
também se pode acrescentar que se adivinha promissor o negócio das explicações
de Português e Matemática e dos colégios particulares (os tais que a abastada
esquerda caviar diz escolher não por causa dos bons resultados mas sim por
causa dos horários ou até por simples acaso, como sucede com a senhora
secretária de Estado da Educação cujas filhas frequentam por acaso, mas só por
acaso, uma escola alemã) pois as disciplinas de Cidadania e a Área de Projecto
não servem para nada de nada a não ser, claro, para doutrinar as crianças e
jovens.
Como é óbvio a quem tenha minimamente acompanhado o que se ministra nessas
aulas, elas versam as maravilhas do socialismo ou melhor dizendo denunciam a
infâmia do capitalismo e da indústria, exaltam o regresso a uma economia de
trocas, a superioridade das causas fracturantes do momento e, como ensina a
experiência de quem foi encarregada de educação nos tempos em essas disciplinas
existiam, afectam horas e horas à problemática da turma, o que está a acontecer
à turma, o que vai fazer a turma…
O ataque às escolas com contrato de associação já o anunciara: não são os
resultados escolares que importam ao Ministério da Educação, mas sim garantir o
poder da corporação do senhor Nogueira e do PCP e fazer da sala de aula um
espaço de ideologia à espera das causas inventadas e por inventar pelas
agremiações que pululam em torno de BE e do PS.
Mas o fenómeno que estamos a viver é muito mais amplo que uma simples
mudança curricular. E está longe de se restringir à Educação. Se repararmos, em
nome de causas apresentadas como progressistas, todas as semanas vemos crescer,
qual polvo, dentro do Estado, os tentáculos da ideologia: uma semana são os curricula que
perdem conteúdos para dar lugar aos comportamentos; na outra as comissões para
avaliar o racismo e o que é o racismo e porque não há queixas por racismo; na
outra e na outra, que o assunto é muito sério e rentável, a reversão da
legislação do trabalho, oficialmente sempre em nome dos trabalhadores e na
prática um esquema em que estruturas cada vez menos representativas tratam de
blindar o seu monopólio na contratação colectiva.
Dos efeitos devastadores da actividade dos comissários-tentáculos não me
restam dúvidas, seja nas escolas, seja na legislação laboral, seja na saúde,
seja nesses bairros das periferias onde, certamente inspirados pelo exemplo
francês, activistas vários tentam criar casos que uma comunicação social cada
vez mais a trabalhar nas redes sociais e menos na rua transmite sem qualquer
noção da realidade. (Quando foi a última vez que um jornalista foi ao Bairro 6
de Maio na Damaia sem ser tutelado por um activista, cientista social ou membro
de uma associação?)
O controlo ideológico das decisões técnicas, que há anos parecia impossível,
acontece agora sem gerara quaisquer perguntas. Veja-se, por exemplo, o caso da
integração dos gays na população de risco para dádiva de sangue: a
Direcção-Geral de Saúde defende que existe risco ou pelo menos defendia até 17
deste mês. Mas os “activistas” e o polvo ideológico defendem que não e basta
tal acontecer para que logo apareçam os títulos que fazem a desgraça de
qualquer ser com existência pública. Resultado, a DGS mudou as suas normas.
Discussão sobre o assunto? Nenhuma. Há risco? Não sabemos.
É este polvo, muito mais do que a economia ou as finanças, que vai
condicionar Portugal nos próximos anos. Porque mesmo quando a geringonça se
desfizer, eles, os comissários, vão ficar lá, blindados nas funções criadas à
sua medida, nos seus cargos ideológicos, nos seus programas que implicam sempre
mais programas. O dízimo que Costa está a pagar à esquerda radical vai
atrasar-nos anos e anos e aumentará em muito a conflitualidade pois o preço da
descrispação presente é a enorme crispação futura que teremos de suportar. Por
cada dia de silêncio e descrispação é mais uma comissão nomeada, um programa
aprovado, um plano equacionado. Todos durante anos e anos vão determinar não só
o que podemos fazer mas também o que devemos pensar e sobretudo o que devem pensar
os nossos filhos e netos.
E aqui chegamos ao que me intriga: como vai ser o pós-polvo? Ou melhor
dizendo, como vai ser o momento em que a geringonça sair do governo e lá
deixar, trabalhando para si, o polvo? Voltaremos ao tempo em que os ministros da
Educação viviam sitiados na 5 de Outubro? Provavelmente sim mas sobretudo
veremos como esse estado dentro do estado, na verdade a sua casta, usará todos
os meios ao seu alcance para manter os seus privilégios e poderes não
escrutinados e desse modo prolongar a geringonça muito para lá da sua vida
eleitoral.
Que governo lidará ou pactuará com isto? Terá o centrão de regressar para
desalojar o polvo? Não sei. Mas sei que seja quem for não vão ser tempos fáceis
de viver.
PS. Curiosamente quanto menos sei sobre um futuro governo mais claro se me afigura o que pode acontecer na Presidência da República: caso se consiga demitir a tempo – ou seja antes de se tornar óbvia a fatura da reposição e das reversões – e com uma boa desculpa, muito provavelmente António Costa será candidato nas próximas presidenciais e ainda mais provavelmente ganhará pois Marcelo, mesmo que conte com a indiferença do PSD, dificilmente contará com o voto dos eleitores do PSD ou do CDS.
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