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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Militares escrevem a Cavaco para que não promulgue Orçamento

Vigília juntou duas centenas
30.11.2011 - 23:04 Por Maria Lopes
Os três ramos das forças armadas entregaram ao princípio da noite desta quarta-feira uma carta na Presidência da República onde pedem a Cavaco que não promulgue o Orçamento do Estado.

A carta foi apenas entregue na portaria, mas os militares esperam que tenha melhor caminho do que os vários pedidos de reunião que têm feito, sem resposta, a Cavaco Silva. Numa curta missiva, os três ramos das forças armadas pedem apenas ao Presidente da República, seu chefe supremo, que não promulgue o Orçamento do Estado.

Em última instância, querem que Cavaco peça ao Tribunal Constitucional a análise da constitucionalidade das normas sobre os cortes nos subsídios de férias e de Natal, adianta o presidente da Associação Nacional de Sargentos, António Lima Coelho. E que, no limite, não promulgue o documento até que dele sejam retiradas as “ordens” que acabam com os dois subsídios. Além de acreditarem que a decisão do Governo é inconstitucional, as três associações representativas dos militares realçam que, ao contrário dos sindicatos da função pública, por exemplo, “e a arrepio da lei”, nunca foram consultadas sobre as medidas de austeridade que também afectam as forças armadas.

Ao fim da tarde, cerca de 250 militares juntaram-se numa vigília, ordeiramente arrumados atrás das grades no jardim em frente ao palácio de Belém, e vigiada por uma dúzia de polícias. Tinha sido marcada no passado dia 12, no final da manifestação da família militar, e foi organizada pela Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA), pela Associação Nacional de Sargentos (ANS) e pela Associação de Praças (AP) – as três têm sempre aparecido unidas nesta contestação.

“Queremos que o Presidente seja coerente com aquilo que já afirmou. Não basta que faça discursos de circunstância. É preciso agir”, apelou o sargento Lima Carvalho, da ANS. Há uns meses Cavaco terá dito que “precisamos de uma política humana e para pessoas concretas, de combate às desigualdades e à pobreza”, citou Luís Reis, da Associação de Praças, na vigília.

Estar nas ruas “é um desgosto”

Lima Coelho diz que “não se podem aplicar cortes cegamente, muito menos às forças armadas, que são instituições que têm por missão a defesa da soberania nacional. É pôr em causa a própria soberania.” O sargento realça que os militares “não se estão a eximir das suas obrigações. Os militares são até os que mais têm dado nos últimos anos, com perdas sucessivas de remunerações.” Dizem-se “disponíveis para o esforço” mas não desta forma, imposto por um “orçamento extremamente punitivo e restritivo”.

Garantindo que os militares preferiam “não se manifestar”, o sargento diz que “é um desgosto” estar na rua a contestar. Mas aparentemente tal desgosto vai manter-se. Se o Presidente promulgar o orçamento os militares prometem continuar a sair dos quartéis para protestar. Para já estão marcados encontros com os militares entre os dias 5 e 17 de Dezembro em Braga, Monte Real, Entroncamento e Beja.

O presidente da ANS diz mesmo que entre os militares há “desmotivação e desencanto” e que até há mesmo “aumento de depressões” e quem se queixe, sobretudo entre as camadas mais novas, de que “não conseguem cumprir obrigações junto da banca”. E faz contas: um casal em que ambos sejam das forças armadas ou um deles seja também da função pública, perde entre 4,5 e cinco salários num só ano: são os subsídios de férias e de Natal e o corte no salário decretado ainda pelo Governo socialista.

As medidas de austeridade “estão a afectar os militares no plano social, familiar e profissional”: “Um militar pendurado num guincho para resgatar um náufrago ou outro que esteja em cenário de guerra não pode estar com este tipo de preocupações”, aponta Lima Coelho.

Reestruturação precisa-se

Se entre os militares que se concentraram em Belém, de bandeira ao ombro ou simplesmente à conversa, havia quem comentasse “sem sangue nas ruas isto não vai lá”, também por ali se comentava a necessidade urgente de uma reestruturação das forças armadas. Os três ramos têm actualmente cerca de 38 mil pessoas.

“A solução para os problemas das forças armadas é redefinir o seu conceito estratégico”, disse ao PÚBLICO um sargento-mor que não quis ser identificado, acrescentando que é preciso, por exemplo, concentrar unidades. “Que sentido faz ter um quartel em Porto Santo, por exemplo, com 14 militares? Quanto é que isso custa só em manutenção?” Mas há mais: no país há três escolas de sargentos e três academias militares – uma de cada ramo. “Não podemos negar as evidências: devíamos racionalizar”, entende também um sargento-chefe. “Temos que redefinir o nosso conceito estratégico: nós somos precisos para quê? E o Governo também deveria dizer o que quer das forças armadas”, acrescenta o sargento-mor. Diz não entender porque razão Portugal tem blindados, quando deveria ter investido esse dinheiro em mais barcos para poder patrulhar a sua zona marítima.

Um dos problemas parece estar na coordenação: apesar de as três associações se entenderem, o mesmo não parece ser tão fácil entre as chefias ao mais alto nível. No início dos anos 90 houve uma tentativa de fusão, mas acabou por ficar sem efeito porque cada um dos ramos teve medo de se descaracterizar. Apenas os três institutos de altos estudados foram fundidos. “É preciso uma reestruturação das forças armadas, é inegável. Mas não tem havido coragem política”, diz um terceiro sargento.

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